segunda-feira, 15 de março de 2010

O Amor em Neruda

Estes dois poemas são ambos do poeta chileno Pablo Neruda e foram retirados de Presentes de um Poeta. A tradução é de Thiago de Mello.

«Eu te nomeei rainha.
Existem mais altas que tu, mais altas.
Mais puras do que tu, mais puras.
Mais belas do que tu, mais belas.

Mas tu és a rainha.

Quando vais pelas ruas
ninguém te reconhece.
Ninguém vê a coroa de cristal, ninguém vê
o tapete de ouro vermelho
que pisas por onde passas,
o tapete que não existe.

E apenas apareces
cantam todos os rios
em meu corpo, as campanas
estremecem o céu,
e um hino enche o mundo.

Somente tu e eu,
somente tu e eu, amor meu,
o escutamos.»



«Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Posso escrever, por exemplo: "A noite está estrelada,
e os astros, azuis, tiritam na distância."

Gira o vento da noite pelo céu e canta.

Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Tanto a amei, e às vezes ela também me amou.

Em noites como esta eu a tive entre os meus braços.
Beijei-a tantas vezes debaixo do céu infinito.

Ela me amou, e às vezes eu também a queria.
Ah, como não amar seus grandes olhos fixos.

Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Pensar que não a tenho. Sentir que já a perdi.

Ouvir a noite imensa, mais imensa sem ela.
E cai o verso na alma como na relva o orvalho.

Que importa que meu amor não pudesse guardá-la.
A noite está estrelada e ela não está comigo.

Isso é tudo. Bem longe alguém canta. Lá longe.
Minha alma não se conforma com havê-la perdido.

Como para trazê-la meu olhar a procura.
Meu coração a busca, e ela não está comigo.

A mesma noite faz branquear as mesmas árvores.
Mas nós, os de outrora, já não somos os mesmos.

Já não a quero, é certo, porém quanto a amei.
Minha voz ia no vento para roçar-lhe o ouvido.

De outro. Será de outro. Como antes dos meus beijos.
Sua voz, seu corpo claro. Seus olhos infinitos.

Já não a quero, é certo. Mas talvez ainda a queira.
Como é tão breve o amor, tão longo o esquecimento.

Porque em noites como esta eu a tive entre os meus braços,
Minha alma não se conforma com havê-la perdido.

Ainda que seja esta a última dor que ela me causa,
e estes sejam os últimos versos que eu lhe escrevo.»

1 comentário:

  1. Ah...que lindo! Pablo Neruda!
    Hoje vim ao cheirinho do versinho
    e não me enganei no caminho
    e com estes aqui, fico muda...
    A beleza da poesia contagia
    quando o poeta chileno se desnuda!...

    Obrigada pela partilha
    um beijinho

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